Nota Técnica CRP 06 n.º 02/2016 – RELATÓRIOS TÉCNICOS PRODUZIDOS POR PSICÓLOGAS/OS NO CONTEXTO INTERNAÇÃO PROVISÓRIA, INTERNAÇÃO E SEMILIBERDADE DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

Às/Aos Psicólogas/os,
 
Considerando ser de grande importância a produção de relatórios pela equipe técnica da Fundação Casa visto o uso desta produção como forma de subsidiar as decisões judiciais; 

Considerando a consulta da Defensoria Pública do Estado de São Paulo sobre casos em que os documentos produzidos por psicólogas/os resultam em provas contra os/as adolescentes, trazendo-lhes prejuízo;

O Conselho Regional de Psicologia da 6.ª Região ORIENTA:

Que não há impedimento na produção de documentos pelas/os psicólogas/os que atuam na Fundação Casa, desde que baseados em estudo de caso com o objetivo de propor estratégias e ações para o acompanhamento do/a adolescente na perspectiva da responsabilização e cuidado, não ocupando lugar de julgamento dos/das adolescentes. 

A/O psicóloga/o atuando no contexto das Medidas Socioeducativas não deve cumprir função de perita/o e, por implicação, não deve produzir provas, pois tal papel prejudicaria os objetivos do acompanhamento pautado na reintegração do/a adolescente e definido posteriormente no Plano Individual de Atendimento – PIA, conforme posto pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE e referendado pela categoria nos materiais produzidos pelo Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas – CREPOP. 

O Código de Ética Profissional da/o Psicóloga/o estabelece que:
 
Art. 2º – À/Ao psicóloga/o é vedado:
 
(…)
 
k. Ser perita/o, avaliadora/r ou parecerista em situações nas quais seus vínculos pessoais ou profissionais, atuais ou anteriores, possam afetar a qualidade do trabalho a ser realizado ou a fidelidade aos resultados da avaliação;
 
Ainda relacionado a este item, é necessário esclarecer que a/o profissional poderá decidir pela quebra do sigilo nos casos de risco iminente contra si ou terceiros, com vistas no menor prejuízo, devendo a pessoa envolvida ser informada sobre tal quebra, conforme observamos no Código de Ética Profissional da/o Psicóloga/o:

Art. 9º – É dever da/o psicóloga/o respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.

Art. 10 – Nas situações em que se configure conflito entre as exigências decorrentes do disposto no Art. 9º e as afirmações dos princípios fundamentais deste Código, excetuando-se os casos previstos em lei, a/o psicóloga/o poderá decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão na busca do menor prejuízo.

Parágrafo Único – Em caso de quebra do sigilo previsto no caput deste artigo, a/o psicóloga/o deverá restringir-se a prestar as informações estritamente necessárias.
 
À luz destes parâmetros, entendemos ser equivocado que psicólogas/os, atuando no contexto das Medidas Socioeducativas, utilizem das informações fornecidas pelos/as adolescentes para produzir provas, principalmente contra os/as mesmos. O que procede, quando necessário, é a quebra do sigilo desde que amparada pelo que prevê o Código de Ética Profissional da/o Psicóloga/o.  

Dessa maneira deve haver o máximo de cuidado nos relatórios evitando-se convocações de predição da reincidência, de criminalização e patologização do/a adolescente. Para isto a/o psicóloga/o deve adotar o Código de Ética Profissional como eixo indissociável de suas ações e orientá-las para a promoção e garantia de direitos dos/as jovens e suas famílias, também através da avaliação psicológica.
 
De acordo com a Resolução CFP n.º 007/2003: 

O relatório ou laudo psicológico é uma apresentação descritiva acerca de situações e/ou condições psicológicas e suas determinações históricas, sociais, políticas e culturais, pesquisadas no processo de avaliação psicológica. Como todo DOCUMENTO, deve ser subsidiado em dados colhidos e analisados, à luz de um instrumental técnico (entrevistas, dinâmicas, testes psicológicos, observação, exame psíquico, intervenção verbal), consubstanciado em referencial técnico-filosófico e científico adotado pela/o psicóloga/o. 
 
A finalidade do relatório psicológico será a de apresentar os procedimentos e conclusões gerados pelo processo da avaliação psicológica, relatando sobre o encaminhamento, as intervenções, o diagnóstico, o prognóstico e evolução do caso, orientação e sugestão de projeto terapêutico, bem como, caso necessário, solicitação de acompanhamento psicológico, limitando-se a fornecer somente as informações necessárias relacionadas à demanda, solicitação ou petição. (Idem, p.7)

O trabalho da/o psicóloga/o deve atender demandas que visem a proteção do/a adolescente, baseando-se no Estatuto da Criança e Adolescente – ECA e Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE, questionando demandas judiciais que contradigam tais princípios e posicionando-se contrariamente a todas as formas de violação de direito e de acordo com os Princípios Fundamentais do Código de Ética Profissional da/o Psicóloga/o.

Por outro lado, são comuns casos em que a/o profissional, atuando em consonância com o Código de Ética e demais resoluções afins às medidas socioeducativas, é demandada/o a produzir documentos que ferem os princípios apontados.

Nestes casos, quando a/o psicóloga/o apresenta argumentações fundamentadas a respeito da impossibilidade de cumprir tais demandas e, ainda assim, são pressionadas/os a produzir provas contra os/as adolescentes, cabe avaliar a caracterização de coerção e/ou violência moral diante de relações de poder. E, sendo o caso, cabe a busca de recursos institucionais, sindicais bem como o apoio de colegas psicólogas/os e outros/as profissionais para providências necessárias. Importa que a matéria seja encaminhada a órgãos competentes para providências cabíveis.
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Secretaria Especial de Direitos Humanos. Subsecretaria de Políticas dos Direitos da Criança e do Adolescente. Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – Sinase. Brasília: CONANDA, 2006. Disponível em: http://www.sdh.gov.br/assuntos/criancas-e-adolescentes/programas/sistema-nacional-de-medidas-socioeducativas/sistema-nacional-de-atendimento-socioeducativo-sinase-1
______. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília, 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Código de Ética Profissional do Psicólogo. Brasília, agosto de 2005. Disponível em: http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2012/07/codigo-de-etica-psicologia.pdf
________ et CENTRO DE REFERÊNCIA TÉCNICA EM PSICOLOGIA E POLÍTICAS PÚBLICAS. Referências Técnicas para a atuação de psicólogos no âmbito das Medidas Socioeducativas em Unidades de Internação. CFP, Brasília, 2010. Disponível em: http://crepop.pol.org.br/novo/wp-content/uploads/2015/09/CREPOP_2010_MedSocioEduc-Internacao.pdf
___________. Resolução CFP n.º 07/2003, que Institui o Manual de Elaboração de Documentos Escritos produzidos pelo psicólogo decorrentes de avaliação psicológica. CFP. Brasília, 2003. Disponível em: http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2003/06/resolucao2003_7.pdf
 
Conselho Regional de Psicologia da 6.ª Região
XIV Plenário – 2013/2016